sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Os links de poemas e da entrevista publicados pela Agl:

http://blogs.abril.com.br/agencia-literaria/2010/10/homenagem-ao-amarelo-solivan-brugnara.html
http://blogs.abril.com.br/agencia-literaria/2010/10/poemas-solivan-brugnara.html
http://blogs.abril.com.br/agencia-literaria/2010/10/agl-entrevista-solivan-brugnara.html

Pequenos poemas

1. . Chamas
Chamam
xamãs

2.Sou o mesmo
incoerente de sempre

3.Cortem todas as árvores
mas por favor deixem as sombras.

4.Havia uma pedra
no caminho de Davi.
Havia uma pedra,
felizmente havia uma pedra.

5.O sol faz seus malabarismos com os planetas

6. Extrai mel do sal.

7.Sobre a indignação

Notei que
soco na mesa
é sempre na sílaba tônica.

8.Desculpe-me por
ter cuspido tantas belezas em sua cara.

9.Um tiro
e o poeta
sangrou uma bandeira soviética.

10. Fico aqui
lapidando vidro.

11.A chuva
cai como crinas.

12.Todo o grande romancista é poeta.
Todo e grande dramaturgo é poeta.
Todo o grande poeta é poeta.

13.O que pintar uma marinha me lembrou

Pintar o mar me lembrou
quando acariciei seus cabelos.

Poema e fotografia de Solivan

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Poemas psicografados de João Cabral de Mello Neto

Estudo sobre a posse

1.O ter um pássaro,
não é no total, ter,
seria mais exata
a palavra prender,
pois depende de grade.
Não é como
o ter uma pedra,
que é um ter mais sólido.
O inerte dá-se facilmente
ao pertencer
ao ficar a tua espera.
Porém pedra
na ignorância das pedras
não sabe que pertence.

2.Dir-se-ia que a estátua
por também ser
feita de carne de pedra
(ou de outra carne com
a mesma imobilidade)
ser de fácil doma.
Porém há na estátua beleza
e a beleza é sedutora,
vê-se na estátua
a vontade leviana de
dar-se a outros, a todos.
Tê-la portanto suscita
(já que é infiel)
tanto cuidado
que é a estátua que te possui.

3.Ter uma chave
diferencia-se da pedra
por poder a chave
encolher suas pernas,
fingir-se morta
e sumir quando propício.
Tem a chave- inseto,
a fuga do prisioneiro
que ao contrário da barata
(esta foge ao perceber-se vista)
foge quando não observado
e esconde-se atrás dos móveis.
Tem a chave o mesmo
exato sumir da caneta,
dir-se-ia da mesma espécie.

4. Mais pleno é ter um cão
que ao contrário da pedra
sabe que pertence
e permanece ao lado
mesmo de quem recebe chute,
(Homem sem pomba no peito)
ou da mão confeitada, afago
(Homem com flor no peito).
O cão quando sem coleira é
preso no desejo de pertencer
e quando morto( agora
sem perceber-se) quer
ainda ser propriedade
mesmo que seus ossos tenham
a ignorância das pedras.

De Solivan

terça-feira, 19 de outubro de 2010



O poema inicia-se luz


O poema inicia-se luz
e enquanto luz
é desprovido de palavras.

Mas neste exato momento de luz
que fecunda
e toma pulso um poema.

Esta luz e o âmago
que atrai palavras
e corporifica o poema

E quando terminada a corporificação do poema
a luz
fica então sendo
o coração do poema
se eterno for o pulso desta luz
então eterno será o poema.


Poema e ilustração de Solivan

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

A beleza é frágil



Foto de solivan
Idéias póstumas para Magritte
Poemas-quadro onde o leitor
é a tela do poeta

Liberdade

Dentro de uma gaiola dourada
uma pomba
voa livre
ante um céu azul com nuvens brancas.

O letrado

Um homem sentado entre suas estantes
tem na pele a palidez
transparente da cera,
está de chapéu coco.
Sua face
é a capa de um livro aberto
“Flores do mal,”
capa verde com letras
e arabescos dourados.
Veste um paletó negro-funeral
tem um odor de morte recente
ou muito antiga
de porões e bibliotecas.

O império das nuvens

Na parede da sala
duas janelas:
na fechada
vê-se um céu azul tranqüilo, com
[nuvens brancas
por detrás da vidraça.
Na que está aberta
nuvens escuras tempestuosas.

O letrado II

Um homem
entre suas estantes
de chapéu coco e paletó preto
em pé, de costas
seu cabelo é preto luzidio
tem os braços virados
para trás.
Segura na mão
um livro aberto
“Flores do mal”
de capa verde com letras
e arabescos dourados.
Sua nuca
lê atentamente o livro.

Contemplação

Um homem
solitário de paletó preto
sem chapéu coco
(está no porta-chapéu
ao lado da porta)
braços abaixados, nas costas
mãos juntas
parecendo alguém
que reza ao contrário.
Com este gesto dos contemplativos
olha atentamente a janela
que é feita de tijolos à vista.
As paredes da casa é que são de vidro.

Premonição

Entre os prédios
nas calçadas, atravessando a rua
caixões transeuntes
com duas pernas de madeira.
Andam de um lado para outro
atrasados
verificam a hora
e estão bravos com
as esposas.

O homem que lê poesia

Um
homem que lê poesia
tem dois narizes no lugar das orelhas
a boca no nariz
digitais no buraco do olho
e um olho de Cíclope
onde era para ser a boca.

Cabeça

O corpo veste um paletó
negro
e acima da gravata
está escrito: cabeça.

De Solivan

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

As Profecias de Igor



As profecias de Igor
para Jorge Linzmeier
I
Sete nomes terá a ovelha com estômago de lobo que trará o
Tempo das algemas abençoadas com vinho, e o escriba da
Masmorra escreverá com cobras, poemas tristes. Um viajante
Irá decorar o livro, será assim contrabandeado e traduzido.

II
No cio das estrelas as aves do paraíso morrerão ao se
Alimentar com as unhas de Sithar, mas assim conseguirão
Levar oferendas para o lado negro da lua onde vive um cão
Dourado que guarda num átomo a história da humanidade.

III
Quando o primogênito reinar, a peste se abaterá sobre
O ouro que ficará coberto de terríveis chagas e as formigas
Desmembrarão os diamantes. Os ciclos parecerão mortos,
Mas uma colméia de lobos negros aprenderá a fazer mel.

IV
No cálice de prata cinzelado com a história dos heróis,
A sacerdotisa ordenhará o sangue simbólico do sacrifício
E entoará aos cardeais do concílio, nova mensagem: o sinal
Da cruz não deve tocar o ombro, mas nas palmas das mãos.

V
Peixes ornamentais nadarão nas chamas das bibliotecas
E a liberdade perderá seus braços como Vênus de Milos
E as esposas terão que beber água do mar para voltar a ter
Lágrimas e aguardar os rouxinóis comporem outra canção.

VI
Aos demônios reunidos, o que foi anjo magnífico anunciará
Acariciando seu gato que uma mãe pacífica em demasia criará
Os trigêmeos do anticristo, então as águias terão que combater
As pombas malévolas e o cordeiro será mais cruel que o lobo.

VII
Quando um coral de bicéfalos e irmãos siameses cantarem
Uma canção natalina para o eclipse, seu sinal.Ele assinará
Com uma pena de corvo um tratado de paz nefasto. Sacrifíca
Tua televisão, teu automóvel no altar de Deus enquanto há tempo.

VIII
O país justo terá suas leis em um pequeno livro de letras
Grandes, usarão apenas vinte carneiros para os pergaminhos.
O rubi valoroso, seu símbolo, ficará exposto na Ágora, sem
Soldados, maldições ou redomas e não será roubado.

IX
Quando a ciência substituir os Sacerdotes na descrição
Do apocalipse e crença na vida eterna for retirada das
Mãos divinas e entregues à medicina saberemos que
o asno apenas substitui uma tolice por outra maior.

X
O homem acreditará no sábio que dissecou o corpo e não
Encontrou alma alguma e assim provou que ela existe.
E no alquimista que escreverá na quinta linha que a matéria
Que se transforma com mais facilidade em ouro é o suor.
XI
Os que pensam emaranhar os desejos na verdade tecem crisálidas
Dirá o deificado que pacificará com luxúria e um novo versículo
Aparecerá na escritura: quanto mais casto, mais furioso é um povo.
E mostrará no sêmen, os pregadores em desterro no sétimo círculo.

XII
Aviões jogarão tigres sobre as cidades e as viúvas gemerão como cedros Caindo e o povo abandonará suas casas como um filhote de cervo a mãe Devorada. No êxodo, poucos sobrevirão bebendo o veneno das serpentes E enriquecendo com sua passagem, os tecelões de mortalhas baratas.

XIII
Será o tempo da última fome no sol nascente, porém somente
Tenores poderão anunciar o suntuoso imperador vestido de jade
Mas para provar sua abnegação se alimentará com apenas um
Pequeno pedaço do baiacu, a maior parte será distribuída a multidão.

XIV
O que lê no passado, o futuro verá uma amarga verdade no seu cristal:
As nações que enriquecerão a custa da servidão se tornarão dignas
Com mais facilidade que as pobres que tentarem ser generosas em
Demasia antes do tempo, estas retornarão a mais triste barbárie.

XV
Quando nenhuma profecia se realizar e a concha não ter mais o
Marulho do mar, o silvo do guepardo, o rosnado do chacal
E o sibilar da serpente, será usado para adormecer as crianças.
A flora gemerá de preocupação porque o leão começará a pastar.

Ilustração e poema de Solivan