terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Luz bonita

Noite, a luz veio bonita e de aço, esmagou o índio bêbado no meio do asfalto pareceu luz de pegar, brincar, levar para as crianças. Mergulhou no vidro, água de rio, de novo menino nadando no rio.
Viu Iracema submersa.
Susto, o índio surge do escuro, emoldurado pelo pára-brisa, depois da curva, com um sorriso assustador de quem olha algo belo. Só vê a face iluminada, o resto era negro, claro-escuro. O baque, o sorriso contra o pára-brisa, engano de pássaro pensando que vidraça era céu. O cheiro defumado do bugre manchou o odor caricatural de flores do campo do aromatizador, e continuou, não em uma fuga de onça, fuga da delicadeza, a feminina fuga assustada do veado.
Outro índio no acostamento viu o carro vindo, aviso de araponga, mas grito não empurra. Dos três o único que sentiu dor, sentiu nele o estalo de taquara das pernas que o outro quebrava, o rasgo na barriga, a cabeça contra o vidro, e o cair de bicho grande abatido no acostamento, odor de anta carneada, o morto cheio de urucum. Jogou com raiva uma pedra inócua, pedra de algodão, de pluma no carro que sumia, pedra que se dissolveu no escuro.

De Solivan

Nenhum comentário:

Postar um comentário