sexta-feira, 23 de abril de 2010

Aboios

Os aboios longínquos
voam pelo céu azul
ocres aves de vozes,
tênues pássaros
que pousam na arapuca de meus ouvidos
e são aprisionados
pela minha lembrança
para que voltem a cantar
para mim toda a manhã.
A música dos aboios
vem dos distantes tropeiros
brilhando em torno deles,
como raios em torno do sol
ou perfume em volta do jasmim.
Os aboiadores se aproximam,
embelezando a estrada de terra
em meio à mata,
assim como o canto do canário
embeleza uma árvore ao amanhecer.
Os aboios
trançam com as vozes
um balaio onde
prendem a tropa.
Aboio é música
que rostos curtidos
de olhar com rugas
iguais a raízes,
sulcos arados
pelo brilho e calor do sol,
pela vida dura
e por sorrisos francos
escrevem no vento e no pó,
o seu canto rude como couro,
salgado como suor,
ríspido como poeira.
São retratos de suas faces morenas.
Têm aboios
que são
repetidos
como contas de um rosário.
Aboios
compridos
como o canto das bocas escancaradas vermelhas
das carrancas do rio São Francisco.
Um canto que não quer acabar mais
ou de sons dissonantes, roucos, rasgados
agudos, encardidos
feito marcas de espinhos do sertão,
na roupa dos vaqueiros.

De Solivan

4 comentários:

  1. me lembro do som dos berrantes, a boiada passando rente à cerca de casa, em Cambé, no Paraná

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  2. Ao ler este poema Solivan a gente sorri. Um misto de contentamento e boas lembranças.

    Beatriz

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  3. Neuzza,berrantes e aboios,são sons irmãos.
    as teluricos sementes das quais nasceram a música.

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  4. Seu sorriso já vale um poema Beatriz

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