Encontro em Copenhague
Sentados no aeroporto em Copenhague
atacávamos juntos o café.
Ali tudo era belo,
confortável —
Ambiente refinado como quê!
E de súbito
aquele velho surgiu,
japona simples e capuz verde oliva,
pele curtida
por lufadas salinas,
ou melhor,
não surgiu,
exsurgiu.
Caminhava,
singrando por turistas,
como se houvesse largado o leme faz pouco,
feito espuma do mar
a barba híspida
branca
emoldurava-lhe o rosto.
Com sombria decisão de vitória
caminhava,
erguendo uma onda volumosa,
através de antiqualhas
de um moderno postiço,
através do moderno posiçando o antigo.
E abrindo a gola da camisa rústica,
ele, rejeitando o vermute e o pernaud,
pediu ao balcão uma vodca russa
e repeliu a soda com um gesto:
“No...”
Mãos gretadas, com cicatrizes,
curtidas,
sapatos grossos, arrastando solas,
calças incrivelmente encardidas, —
era mais elegante
do que todos em roda!
A terra sob ele como que afundava,
com o peso daquelas passadas.
Um dos nossos sorriu-me:
“Ei!
Veja se não parece Hemingway!”
Caminhava,
expresso em gestos curtos,
andar de pescador, pesado, lento,
todo talhado num rochedo bruto,
como através das balas,
através dos tempos.
Caminhava, encurvado, como na trincheira,
abria caminho entre pessoas e cadeiras...
Parecia-se tanto com Hemingway!
— Depois fiquei sabendo:
era Hemingway.
IEVTUCHENKO, Ievguêni. Encontro em Copenhague. Trad. de Haroldo de Campos e Boris Schnaiderman.